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LITERATURA DE MATO GROSSO
LITERATURA DE MATO GROSSO

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Em Cuiabá o Romantismo iniciou por volta de 1860 quando aqui veio residir o oficial da marinha Antônio Cláudio Soído. Foi o introdutor do Romantismo em nosso Estado. Ele conseguiu despertar a literatura e os literatos para a nova corrente que surgia. Ele sofreu influência de Vitor Hugo e Byron, deles traduzindo obras de grande valor.

Com a vinda de Soído aparece uma literatura mais pura e mais digna. É bem verdade que no começo as obras eram ainda simples, pequenas, mas já impregnadas de caracteres..românticos.

A..POESIA

E foi com poesia que o Romantismo aqui chegou. Eram poemas simples, pequenos, compostos sem muitas preocupações, às vezes oferecidos às damas. Elogiavam a natureza e a fartura existente. Não são tão tristes como os de produção nacional. Os poetas não tinham tanta sede de morte como os verdadeiros românticos. São repletos de graça e simplicidade. Às vezes apresentam um tom humorístico, ou satirizantes, porém não tão ofensivos. No poema abaixo observaremos um tom bem humorístico:

 

 

MELINDRES
Antônio C.Soído
Tantos dotes, e a força da cachaça
A todos destruía juntamente!
Porque a beleza já tirava a graça,
Nulificava a do metal luzente,
Empanava-lhe o gênio e a ilustre raça,
E tornava o ingês um descontente,
Tanto pode, ó cachaça, e força tua...
Mas em Byron também andava a lua...

É um poema extremamente simples, porém notamos uma preocupação Byroniana. Aí ele fala sobre os males da cachaça, portanto não é um poema ofensivo.

As damas também eram lembradas, vejam por exemplo, o que fez Soído ao receber folhas secas de uma senhora:

FOLHAS SECAS*
Antônio C.Soído
Folhas de rosa flor,
Qu?importa que sem verdor
A morte simboliseis,
Se mesmo assim me dizeis:
Que ela se lembra de mim?!...

Secas como estais servis,
Pois a lembrança exprimis,
E mais cheia de saudade
Do que verdes a beldade
Realçando de uma flor.


Ele retribuiu à senhora com um poemeto simples, porém cheio de graça.

PRINCIPAIS..POETAS:

1.Antônio Cláudio Soído - nasceu no Espírito Santo em 1822 e faleceu em Cuiabá em 1889. Foi almirante e chefe de esquadra. Desempenhou importantes trabalhos em Mato Grosso. Foi inspetor do arsenal da marinha. Viajou pela Europa como professor da Escola Naval. Escritor e Poeta. Introdutor do Romantismo em Mato Grosso. Não escreveu muito, porém seus trabalhos são muito significativos. Obras: "Diário do Rio de Janeiro", " O Pirata(traduzido de Lord Byron), "Lembranças de Montevideo", "A menina Oriental"(Poema), "O Batel"(Poema), "Para os pobres"( tradução de Vitor Hugo), "A visita de S.M.aos hospitais do empestados"(Poema), "O corsário" ( tradução de Lord Byron)

A MENINA ORIENTAL

A menina oriental,
Como a gárrula argentina,
Tem de goda alva tez fina,
Feições nobres, rosto oval;
E da Moura feiticeira,
Como tem a brasileira,
Lindos olhos matadores,
Negro, lustroso cabelo,
Onde, segundo o modelo
De París, enxerta flores.

Ela, como a brasileira,
Tem o porte Majestoso,
Corpo esbelto, gracioso,
Delgado como a palmeira;
De viva imaginação,
Ela ama o turbilhão,
Da cidade populosa;
Quer o luxo e sabe bem
Com a seda farfalhosa.

A menina oriental
Fala essa língua sonora,
Feita da latina e moura,
Da portuguesa rival;
Ela conserva de amores
As lembranças, como as flores,
Do pundonor sob o véu;
É patriota exaltada,
Para ela não há nada
Como seu Montevieo.

 

 

Antônio Augusto Ramiro de Carvalho -Nasceu em Cuiabá em 1833 e aqui faleceu em 1981. Funcionário da tesouraria da fazenda, sendo promovido até atingir o posto de inspetor. Deputado da província. Jornalista e poeta humorístico. Fundou alguns jornais humorísticas: "Pega onça", "Dunda". Redator de "A situação" e com o surgimento da República funda "O Quinze de Novembro". Não foi bom poeta. Deixou-nos pouca coisa, como o poema a seguir:

DOIS DE DEZEMBRO

Muita nédia cavalgada
Correndo desembestada
Por meio da multidão;
Muitos rufos de tambores,
De sino muitos rumores,
muitos tiros de canhão.

Muita farda agaloada,
Bonita - mas estragada
Nos usos da procissão
e outros muitos quejandas
Rechonchudas burundanças
No barulho da função.

Tudo houve com fartura
Na solene formatura
Deste dia nacional;
que excitou-me até saudade
Da gorda variedade
Dos dias de carnaval.

 

 

 

Amâncio Pulchério de França - Nasceu em Cuiabá em 1846. Foi comerciante, advogado e poeta. Redator do jornal "O 1o.de Março". Colaborou em diversos jornais locais sob o pseudônimo de Palmiro. No Rio colaborou na revista "A luz". O produziu muito pouco. Imitou pessimamente Casimiro de Abriu. Só se conhece um poema deste autor, o que segue abaixo:

OUTRORA E HOJE

Meu Deus, que gelo, que frieza aquela,
que indiferença nos olhares seus!
Vejo outra nuvem no horizonte de hoje,
Negra coberta nos azuis dos céus!

Tivera flores, meu jardim de outrora,
Tivera rosas de perfume eterno,
Mas hoje as flores em aroma, secas,
Parecem flores de jardim de inverno.

A primavera de meus dias, linda,
Sorria leda para o céu de anil,
E o céu faceiro desdobrando os mantos,
Já teve as galas das manhãs de abril.

Hoje os cantos que tivera outrora
São tristes cr?oas de cruéis martírios
Fora ditoso, já gozara crente
vivo perfume dos meus alvos lírios!

Sonhara encantos, deleitosos dias,
Mato castelo de europel sonhado;
Feliz eu fora - mas o manto espesso
Cobriu a tela desse meu passado.

 

 Antônio Gonçalves de Carvalho -Nasceu no Rio de Janeiro em 1844 e faleceu no Rio. Advogado formado em São Paulo, ratificando-se em Cuiabá onde se tornou juiz. Foi deputado em 1881. É mais conhecido como o poeta da "Flor da Neve" por ter escrito um poema do mesmo nome. Obras: " Cartas ao Sr. William" - reunidas mais tarde em "A estrada de ferro para Mato Grosso e Bolívia". Colaborou em vários jornais.

FLOR DE NEVE
Se a neve fosse planta e flor tivesse,
Tu serias da neve a flor, gerada
Da fria viração ao tênue sopro
À luz da luta, aos beijos duma fada.

Se a neve fosse planta e flor tivesse
Tu serias da neve a flor mais bela
Que brilhando na etérea imensidade
fanal de Amor - adamantina estrela.

Se a neve fosse planta e flor tivesse,
Tu serias da neve a flor tão pura!

Ah! Teriam em ti achado os homens
O símbolo da mais cândida ventura!

Se a neve fosse planta e flor tivesse,
Tu serias da neve a flor bandida...
Causarias ciúmes aos próprios lírios
Que dos jardins do céu a brisa agita.

 

 

 

 

Antônio Telentino de Almeida - Nasceu em Rosário Oeste em 1876 e faleceu em Santo Antônio do Leverger em 1936. Advogado, poeta e jornalista. Entre os poetas deve ser considerado o maior romântico de Mato Grosso. Apreciado por Monteiro Lobato. Foi o responsável por uma completa mudança de concepções de estilo. Foi o último dos românticos, já apresentando em suas obras, características parnasianas. Publicou bons sonetos como "Cor Lapidis". Entre suas obras podemos citar : "Ilusões Doiradas", "A Índia Rosa", "A retirada da Laguna", "Romeiros do Ideal", "Mil vezes Salve".

A RETIRADA DA LAGUNA

Vem de São Paulo, de Goiás e Minas,
Por densas matas, chapadões, colinas,
Ínclitos moços de sorrir taful;
Os rios erguem e caudal bramante,
De pronto a cortam, prosseguindo avante,
Vão para a guerra que ensanguentam o sul.
Dois anos já de travessia ousada!
Muitos findaram na cruel jornada
Até Miranda que alarmada está;
Daqui por diante são o horror, a guerra,
As privações por inimiga terra...
Quantas angústias os esperam lá!...


Tivemos outros poetas como José Thomaz de Almeida Serra, Pedro Trouye e outros.


PROSA ROMÂNTICA

Se a poesia encontrou terreno fértil em nosso rincão, o mesmo não aconteceu com a prosa. Houve muitos escritores, porém se enveredaram nos ramos da história, geografia, oratória, letras científicas e jurídicas, estudos linguísticos, folclore, etc. Ou deixaram de lado a literatura ou esqueceram-na.
Entre os escritores da época podemos citar os nomes de Augusto João Manuel Leverger, Caetano Manuel de Faria Albuquerque, Antônio Correa da Costa, Manuel Espiridião da Costa, Cândido Mariano da Silva Rondon, Estevão de Mendonça, Firmo José Rodrigues e muitos outros.

 

 AUTORES COMTEPORÂNEOS

AFONSO HENRIQUE RODRIGUES ALVES

Foto do autor: 

POEMAS INÉDITOS

 

 

 Biografia 

Nasceu em Rondonópolis, MT (1985). Estuda Ciências Sociais na UFMT, mas se considera ainda um amador em leituras filosóficas e poéticas.

 

 

Tento, soluço

um parto difícil

Estancar um rio de sangue

Tranças de cabelos escorrem

Salientes de uma mediação vinda do olhar

A pessoa que canta o cipó se envolve na algaravia

Paratática numa quebra que vem e se repete

Pequenos arbustos pretos-cinza

a segurarem o fio – cacho.

 


 

 

           Perdi dentro de mim

fio-labirinto-estese

e hoje me sinto-corte;

saudades de só ter linhas e caminhos

pilares da ponte do gozo

a volta da odara no quarto ruidoso

sinto o uno

os pés de sátiro voltam a mexer

e ritmar na cama


 

 

Ágora... Há um momento em que perpasso As sombras, os sonhos e as formas do indefinido O vulgo de um olhar, étimo Teus cabelos num instante desnudam-se O que seria? O que seria dito pelo vento dos meus sopros? O que dos zéfiros das previsões? Apenas o tempo poderá responder o que o riacho-oráculo previu pelo átimo Despedimo-nos desapercebidos, consolados por toques de tons que acalmam a ponte.

 

-----------------------------------------------------------------------------------

 

Conhecimento tem sonoridade de diafragma enche os pulmões e deixa respirar o ar puro fluído da vida-indigência numa panóplia libelada de qualquer criação, ilação capaz de passar pelo momento celérico longe do fluxo das armadilhas cotidianas Fausto de minhas vitórias, instante de fazer turibular minha aura em tudo que passa por meu envolto querer.

 

  

 ----------------------------------------------------------------------------------

 

Olhos se comportam como fontes

modelam o querer

viril ponto-cego – idêntica entrada onde o que é – é

assalto que se torna entre pântanos - sugam, fundo, arredios

Leves ventos feitos pela mão nos cabelos da nuca,

Ressabiados no altar,

Repousam como beija-flor

Ilusão rápida de vários pensamentos

êxtase turvo de vinho

saída rápida do eu

 

 

ANTÔNIO SODRÉ

 

(biografia)

Descobri o livro do poeta numa feira de cultura em Campo Grande, em minha última viagem à bela capital de Mato Grosso do Sul. Os amigos e admiradores do poeta me animaram a publicar uma página em sua homenagem. Comprei o livro, li, gostei. Ele é de Mato Grosso e está vivendo em Campo Grande. 

Antonio Miranda, dez. 2006

 

 

O livro Empório Literário reflete uma fase madura do poeta que milita na literatura mato-grossense há mais de 20 anos. 

Na década de 80, entre o bar Candeias e o bar do Léo, sendo influenciado pela efervescência cultural do ambiente universitário, Antônio Sodré começa a produzir as suas primeiras poesias.

Em 1984 com a sua poética caótica e heterogênea, o poeta da transmutação, como se autodenomina, publica o seu primeiro livro, uma brochura, com 13 poemas, contando com a ilustração do artista plástico Adir Sodré, seu irmão.

Além da poesia, a música e as artes plásticas também transitam no seu processo criativo. Como músico, já foi integrante do grupo BandoGira, participou do evento Mecânica da Palavra.

  

Sua história com o Caximir começa em 1984, naquele momento então chamava Caximir Bouquet, em homenagem ao desodorante da época.”   

 

manifesto 

faça-se o poema, de qualquer forma:

aberto,

fechado,

rasgado,

solto,

louco,

livre, rimado, trovado,

travado,

com letras miúdas, grandes, grávidas!

 

faça-se o poema:

marron, vermelho, branco, negro, roxo, verde,

escarlate ...

cor-de-chocolate,

com batom ou sem batom:

faça-se o poema!

 

faça-se o poema: é uma ordem da vida!

essa ordem que não tem compromisso

como o poema

que é feito sem compromisso,

pois ele já é em si um compromisso feito

como a vida, feito um poema ...

e o poema se faz

como se faz a dor

costurada, amordaçada, sangrando,

palpitando num delírio

que faz do poema

que faz da dor:

a força que move o mundo!

 

 

 

 

 

sonhostantostontossonhos

os sonhos sonhei-os todos

num sonhar desesperado

até me perder sonhando

imerso no meu passado

 

recordações ilusórias

quimeras imagens tolas

gravadas no inconsciente

"pra" no presente repô-las!

 

suscitou-me pesadelos

assanhando meus cabelos

oh! era melhor não vê-los

soaram em vão meus apelos!

 

mas tem sonhos tão gostosos

dá vontade de comê-los

suaves vôos de aves

caravanas de camelos

transportando em seus alforjes

doces, balas, caramelos!

 

flutuando ... flutuando ... flutuando

 

feito espuma colorida

que chego a pensar que a vida

é um sonho em movimento.  

 

 

 

abismumano

 

um abismo me separa

dos meus próprios semelhantes ...

 

mas se tento chegar mais perto deles

sinto estar mais longe

do que estava antes!

 

é que entro cada vez mais

para dentro de mim mesmo

numa viagem, que se afasta da chegada,

pois vou pra lugar nenhum

numa lenta caminhada ...

 

... que me diminui

não sou, pois nunca fui...

 

... apenas me desfaço

como uma estátua que rui! ...

 

 

  

corparla porcorea

 

todo corpo é porco

todo porco é corpo

 

pouco porco

muito

porco

todo corpo é porco

todo porco é corpo

corparia

porcórea

porcaria

corpórea

porcoral mente

corporalmente

na cama

na lama ...

corpumano

porcumano

 

Extraídos de EMPÓRIO LITERÁRIO: VERSOS DIVERSOS. Cuiabá: Carlini & Caniato, 2005. 143 p.

 

Autor: DOM AQUINO CORRÊA


 

Biografia

 

D. Aquino Correia (nome civil: Francisco A. C.), sacerdote, prelado, arcebispo de Cuiabá, poeta e orador sacro, nasceu em Cuiabá, MG, em 2 de abril de 1885, e faleceu em São Paulo, SP, em 22 de março de 1956. Eleito em 9 de dezembro de 1926 para a Cadeira n. 34, na sucessão de Lauro Müller, foi recebido em 30 de novembro de 1927, pelo acadêmico Ataulfo de Paiva.

 

 Obras:

 

DEUS!

 

Quem fez, ó minha alma, estas verdes campinas,

 

Quem fez a bonina, quem fez estes céus?

 

Quem fez nestas vargens as lindas palmeiras,

 

Louçãs e altaneiras, quem foi, senão Deus?

 

 

 

Quem fez esses astros que brilham nos ares,

 

Quem fez dos luares os fúlgidos véus?

 

Quem fez essas aves gazis e canoras,

 

Quem fez as auroras, oh! quem, senão Deus?

 

 

 

Quem fez esse plácido olhar do inocente

 

Que fala, eloqüente, até mesmo aos incréus?

 

Quem fez o sorriso das mães carinhosas,

 

Melhor do que as rosas, quem foi, senão Deus?

 

 

 

Quem foi que te deu, com a fé e a esperança,

 

O amor, essa herança negada aos ateus?

 

Oh! quem contará outras dádivas santas,

 

Tão ricas e tantas, que houveste de Deus?

 

 

 

São mais, muito mais que as infindas estrelas,

 

Que orvalham, tão belas, o azul destes céus;

 

São mais do que as flores gentis desta terra,

 

Que, entanto, as encerra infinitas, meu Deus!

 

 

 

Quem, pois, ó minha alma, tem tantos direitos

 

Aos férvidos preitos dos cânticos teus?

 

A quem votarás dos teus santos amores

 

As místicas flores; a quem? só a Deus!

 

 

 

AS LAVRAS DO SUTIL

 

Antemanhã, quando no céu de leste,

 

Mal se esgarçava em luz a noite mansa,

 

Miguel Sutil de Sorocaba avança,

 

Rumo ao mistério do sertão agreste.

 

 

 

Estrada longa e atroz! Mas ele a investe,

 

Com redobrado heroísmo, e não se cansa.

 

Vão-lhe à frente dois índios, e a Esperança

 

Visões de ouro não há, que não lhe empreste.

 

 

 

E  ei-los que chegam a estes sítios belos,

 

Onde o outro excede todos os castelos,

 

Do sonho audaz do bandeirante. Lá,

 

 

 

Ao longe, em praias verdes e desertas,

 

Faiscava o rio...  Estavam descobertas

 

As minas imortais do Cuiabá.

 

 

 “INDEPENDÊNCIA OU MORTE”

 

À “Brigada Branca” dos Colégios Salesianos

 

 

 

 

 

Foi sobre a tarde, quando o sol declina,

 

Hora divina das contemplações,

 

Hora do Gólgota, sublime hora,

 

Marcada outrora para as redenções.

 

 

Deus decretara redimir a terra,

 

Que o nome encerra da sagrada Cruz,

 

E a um jovem príncipe entregou a espada

 

Dessa cruzada de infinita luz.

 

 

O herói passava, em seu ginete airoso,

 

Ao sol radioso, que esmaltava os céus:

 

O ideal fremia-lhe na fronte inquieta,

 

Era a silhueta de um estranho deus!

 

 

Tinha a seus pés, por pedestal, o outeiro

 

Alvissareiro do Ipiranga em flor;

 

E a brisa e as árvores e a onda flava,

 

Tudo cantava de esperança e amor!

 

 

E quando ergueu aquele sabre de ouro,

 

E como estouro de vulcão fatal,

 

Rugiu nos céus: “Independência ou Morte”

 

Tinha no porte, um heroísmo ideal!

 

 

Responde ao grito, e, delirante, brada

 

A cavalgada, que nos fez nação;

 

E o luso tope, que algemava os braços,

 

Rola em pedaços no brasílio chão!

 

 

Entanto o grito: “Independência ou Morte!”

 

De sul a norte, num fulmíneo ecoar,

 

Livres bandeiras pelo azul desata,

 

Numa fragata lá transpõe o mar!

 

 

Desde o Itatiaia, que assoberba os ares,

 

Até Palmares, repercute a voz:

 

Ouvem-na os manes dos fatais guerreiros,

 

Dias, Negreiros e Poti feroz.

 

 

Sorri-lhe o espírito imortal de Anchieta,

 

Anjo e poeta, que o Senhor nos deu;

 

E, do além túmulo, como que suspira

 

A infausta lira do gentil Dirceu.

 

 

Brota de tudo, e se ouve um hino ardente,

 

Ardentemente, pelo azul cantar,

 

Um como hino de Natal que erra,

 

Do céu à terra, e da montanha ao mar!

 

 

E qual Andrômeda, sorrindo agora,

 

A voz canora do novel Perseu,

 

Tal surge a Pátria do Cruzeiro lindo,

 

Livre, sorrindo, para o azul do céu!

 

 

Sublime grito: “Independência ou Morte!”

 

Que o jugo forte do opressor destróis!

 

Da liberdade és o fatal dilema,

 

O eterno lema de um país de heróis!

 

 

Não és o grito da anarquia infame,

 

Que espuma e brame, contra Deus e o rei;

 

Tu és o cântico da liberdade,

 

Que não evade os muralhões da lei!

 

 

Tu és um raio dessa Cruz bendita,

 

Que além palpita, em nossos puros céus;

 

És o diadema de uma Pátria ingente,

 

Que, livre e crente, só se humilha a Deus!

 

                                               1917

 

Autor: IVENS CUIABANO SCAFF


Biografia

1951 Ivens Cuiabano Scaff, médico e escritor, poeta autor de Mil mangueiras, entre outros.

 

 

 Obras:

 

Mil mensagens

 

discreta e presente

integrada no céu da tarde

a grande mãe

 

mais tarde reforçará o brilho

frente às trevas

 

branca

apenas boia na claridade

como numa cadeira de balanço

 

relançando serenos raios ao sol poente

quieta

já um espetáculo

esperando pra entrar em cena.

 

por uns belos olhos

me esqueci

de tudo que tinha ou era

do que soubera

de todas as quimeras

no caminho do não pisar.

 

hoje vejo que tudo foi

como procurar num aquário

o peixe escondido

e não encontrar.

 

sonhar é bom,

estranho é acordar.

 

 

Me faz uma casa

 

ah! minha gentil arquiteta

me faz uma casa

e eu te convido a morar

 

uma casa aquática assim

com uma piscina imensa

formato?

claro que o do mar Egeu

 

me bola uma casa ventosa

pra tilintar campainhas chinesas

derrubando os vasos das mesas

— e você reclame ao arrumar -

 

uma casa bem gostosa

uma varanda pra prosa

toda a noite apos o jantar

 

use os teus materiais modernos

mas preserve o barulho da chuva no telhado

algum canto fresquinho e sombreado para eu poder cismar

um jardim com um jeito antigo

um portal com um ar amigo

convidando a se entrar

suíte pra mim é nome de música

quero então uma alcova

onde eu depondo a armadura

me arme de toda a candura

para poder te amar

 

vai! desenha a casa

vamos sonhar

pagando o resto da vida

as prestações do BNH.

 

Autor: JOCA REINERS TERRON


JOCA REINERS TERRON

 

Biografia

 

Joca Reiners Terron (Cuiabá, 9 de fevereiro de 1968) é um poeta, prosador, artista gráfico e editor brasileiro. 

 

Radicado em São Paulo desde 1995, Joca estudou Arquitetura na UFRJ e formou-se em Desenho Industrial na UNESP. Publicou os livros de poemas Eletroencefalodrama (1998) e Animal anônimo (2002) e os de prosa Não há nada lá (2001), Hotel Hell (2003), Curva de Rio Sujo (2004), e Sonho interrompido por guilhotina (2006). Foi editor da Ciência do Acidente

 

Seus textos integram diversas antologias nacionais e estrangeiras, como Na virada do século - poesia de invenção do Brasil (2002), editada por Frederico Barbosa e Claudio Daniel, Rattapallax, editada nos EUA (2002), e Tsé=tsé, editada na Argentina (2000).

 

 Obras:

 

          HMN

 

Meu último dia útil

 

INTEIRO: Hmmm, não moverei

 

dedo, parte dúctil ou tátil

 

de mini partes quaiquer

 

encontráveis em mim, múltiplo

 

fazer nada labiríntico: Hmmmm

 

 

Ancas em ondas

 

bovinas de grama movida,

 

minha Minotaurina

 

 

 

UM MILHÃO DE BITS

 


Um milhão de bits

 

em um milionésimo

 

de segundo, amor

 

 

 

um súbito sussurrar

 

de sílabas suas

 

ecoa em mim mil

 

 

 

beats, batida comum

 

em corações binários

 

zero: um: zero: um

 

 

 

um breve bater de

 

pálpebras e sentidos

 

explodem modulados

 

 

 

por modems emol

 

durados, amor, em

 

fibras óticas, num

 

 

 

átimo e vibras, pênsil

 

por sobre o éter, num transe high definition

 

 

 PRIMEIRO MOVIMENTO

 

 Abrandou-me; cobriu.me co’a anca;

 

disse dorme; o olho na névoa;

 

abençou-me; corpo(s em) trégua;

 

cum pisco da pálpebra branca;

 

 

 

- Pele pele-manta; imanta

 

a culpa; monstra-encrenca;

 

e afronta; pele, pele branca;

 

o cancro que minha mente enfrenta;

 

 

 

brinco inca; câmara de tintas;

 

finca pé ante o nono sono;

 

campo bento em que Onan brinca;

 

 

 

-Palmo calmo de pele; pele-nunca;

 

naco branco que toda boca trinca;

 

lacero-te; mas; não; nem;nunca; nunca 

 

 

Autor: JOSÉ DE MESQUITA


 

Biografia (1892-1961)

 

José Barnabé de Mesquita [(Cuiabá, 10 de março de 1892 — Cuiabá, 22 de junho de 1961) foi um poeta parnasiano, romancista, contista, ensaísta, historiador, jornalista, genealogista e jurista brasileiro, formado pela Faculdade de Direito de São Paulo em 1913.  Exerceu as profissões de professor, magistrado, além de haver exercido cargos políticos nas esferas municipal e estadual.

 

Obra poética: Terra do Berço, Epopéia mato-grossense, Três poemas da saudade, Escada de Jacó, Roteiro da Felicidade  e Poema do Guaporé.

 

          Obras:  

 

CÓPIA OU ORIGINAL

 

Ter teu retrato assim, corpo inteiro. Querida,

 

é para mim, a um tempo, alegria e tortura,

 

— alegria, pois vejo o sol da minha vida,

 

que, após tão longa ausência, irradia e fulgura;

 

 

 

mas tortura, também, tantálica e doida,

 

pois que te vendo assim, suave criatura,

 

— cópia viva do que és, uma rubra ferida

 

se me abre dentro d´alma, em imensa amargura.

 

 

 

Como quisera ter-te aqui sempre ao meu lado,

 

dia e noite e poder beijar-te como beijo

 

tua fotografia, o teu Corpo adorado!

 

 

 

Cansado de sonhar, eu aspiro ao real,

 

e, no meu louco amor, o eu ora mais desejo

 

é que me dês, em vez da cópia, o original...                 

 

 

 

CIVITAS MATER  *

 

"Meu carinho filial e meu sonho de poeta

 

Vêem-te, ó doce cidade ideal dos meus amores,

 

Em teu plácido vale, entre colinas, quieta,

 

Como um Éden terreal de encantos sedutores.

 

 

 

Tuas várzeas gentis estreladas de flores

 

Sagram-te do sertão a Princesa dileta

 

E o Sol te elege, quando, em íris multicores

 

Na esmeralda dos teus palmares se projeta.

 

 

 

Nenhuma outra cidade assim à alma nos fala,

 

Dos teus muros senis a tradição se exala

 

E a nossa História inteira em teu brasão reluz.

 

 

 

Ainda hoje em teu ambiente, ó minha urbe querida,

 

Paira dos teus heróis a sombra estremecida

 

- Nobre Vila Real do Senhor Bom Jesus"!

 

 

 

* Poema dedicado à cidade de Cuiabá.

 

 

Autor: LUCINDA NOGUEIRA PERSONA

 
LUCINDA NOGUEIRA PERSONA

Biografia 

 

Paranaense de Arapongas, vive em Cuiabá, Mato Grosso, Brasil.  Na poesia estreou com Por imenso gosto (Massao Ohno, 1995) — Prêmio Especial do Concurso Cecília Meireles (1997) da União Brasileira de Escritres – UBE. Pela 7Letras, publicou Ser cotidiano em 1998 e Sopa escaldante em 2001 – Prêmio Cecília Meireles (2002) da UBE e Leito Ao Acaso, de 2004.  É autora de livros infanto-juvenis, contos e crônicas. Professora da Universidade Federal de Mato Grosso e Universidade de Cuiabá

 

Obras:

 

AQUELES POMBOS

Mais uma vez escrevo
o que não tem sentido:
interessante foi a atenção
que me prestaram
aqueles pombos em Veneza
desenho animado
em torno de meu corpo
como se fossem pombos mesmo
(e não pombos)
e eu talvez
como se verá sempre
uma existência entregue
a um programa de inércia
mas não como se fosse torre

Aonde quer que eu vá
me levo como sou.

 


PRATOS DE SOPA

Os pratos de sopa
fumegavam
servidos à família
Uma concha de sopa
em cada prato
regulava nossas vidas
nem antes
nem depois do crepúsculo
Nesse horário
num ligeiro abrir e fechar de porta
ou num pisca de olhos
uma sombra entrava na casa
uma sombra entrava na carne
Complicando um pouco as coisas
escuridão e carne eram uma só coisa

(dormíamos)

         O sono igual matérias
         que completamente diferem.

 



AÇÚCAR

Do cristal bom:
até onde se pode falar nisto
eu falo

a presença do açúcar
determina o roteiro exato
os caminhos de ida e volta:
como a ida pode ser alegre
como alegre pode ser a volta.

 

 

UM HOMEM TRISTE

 

Em local desprotegido

 

caiu a noite.

 

Nuvens dilaceradas

 

flutuavam distantes

 

como lenços perdidos.

 

 

 

Um homem triste

 

olhando o teto de estrelas

 

pensou: sou pequeno

 

terrivelmente pequeno

 

e mais ainda diminuiu em altura.

 

 

 

Depois, por certo tempo, ele chorou.

 

Não a quantidade necessária

 

para cada amargura soterrada

 

porém o suficiente

 

para alívio momentâneo.

 

 

 

Quando voltou a olhar o céu

 

frangalhos de nuvens

 

estrelas

 

pensava um pouco melhor:

 

eu sinto outra coisa maior

 

maior do que qualquer constelação

 

o que eu sinto é enorme e se estende

 

em todas as direções

 

(mas o que é eu não sei).

 

 

         (De Sopa Escaldante)

 

QUARTO 412

 

As vezes

 

em outros lugares

 

não sou a mesma.

 

 

 

Ibis Hotel, quarto 412.

 

É muito tarde

 

estou cansada

 

mas não quero perder os objetos

 

tal como se apresentam.

 

Um espelho entorpecido

 

recolhe as imagens que irão

 

desaparecer no escuro.

 

 

 

Outras vezes

 

são os lugares que não querem me perder

 

Não tenho certeza de nada

 

quantas pessoas já dormiram neste quarto?

 

quantas já se amaram nestes lençóis enrugados?

 

quantas vezes as mesmas palavras foram ditas?

 

quantas palavras já morreram

 

entre estas quatro paredes

 

(revoltas e perigosas)?

 

 

         (De Sopa Escaldante)

 

MATO GROSSO EM LABAREDAS

 

Ontem, no telenotícias do meio-dia,

 

vi cangurus desnorteados

 

num incêndio na Austrália.

 

De imediato, sobre o leito de cozidos

 

remontaram outras imagens

 

dos incêndios deflagrados

 

na paisagem regional.

 

Vi Mato Grosso em labaredas

 

as labaredas como cordas estrangulando

 

gargantas que se uniam

 

na música da carne em combustão.

 

Vi emas atônitas

 

despenhando ao longo das chamas

 

e serpentes abrasadoras subindo

 

pela agitada coluna de fogo.

 

Muito mais tarde (penoso contar)

 

vi ninhos e lagartos ao rescaldo.

 

 

      De Leito de Acaso)

 

 

 COISAS QUE MORTAS PENSAMOS

 

Episodicamente

 

a vida aparece.

 

Isto não quer dizer

 

que nos intervalos

 

ela não exista.

 

O que há de notável

 

(ou mais do que isto)

 

é que a vida se manifesta

 

nas coisas que mortas pensamos:

 

no seio do amarelo

 

e algum conflito

 

no luto das sementes

 

que retornarão aos ramos.

 

Não sei quantas vezes ainda

 

buscarei a realidade

 

na realidade oferecida

 

por um mamão cortado ao meio.

 

 

 

O que também não sucede

 

aos demais transeuntes

 

quando atravessam cozinhas?

 

 

Autor: MARILZA RIBEIRO

 

Biografia 

 

Marilza Ribeiro Cardoso nasceu em Cuiabá, capital do estado de Mato Grosso, Brasil, em 1934. Militante política, poeta, professora de biodança e atriz de teatro.

 

Obra poética: Meu grito – poemas para um tempo de angústia  (1973), Corpo desnudo  (1981) e Cantos para a terra do sol (1997), além de uma vasta obra inédita.

 

Extraído da obra FERREIRA, Sônia. Chuva de poesias, cores e notas no Brasil Central: história através da arte.  2 ed. Goiânia: Ed.da UCG;  Ed. Kelps, 2007.  293 p.  ISBN 85-7766-103-2

 

 Obras:

 

SEM TÍTULO

 

 

Rio e terra / rio e serra

 

         Rio e barco na avenida dos desterrado

 

Homem e rio / sentindo o gosto da hora-fruta

 

         Do sonho e da luta

 

Rio que brota do peito do homem

 

         O rio e grito

 

A canoa que parte levando o sonho do homem

 

         O sonho e o grito

 

Mulher e filho na margem do rio

 

         A mulher e o grito

 

Força que embala o tempo e o rio

 

         O tempo e o ritmo

 

Pés descalços que dançam a batida do tabaque

 

         A dança da vida

 

A cantoria que evoca na noite a força do rio

 

         A dor e o grito

 

No gesto do homem e a correnteza do rio

 

         A mulher e o rio

 

Saia que roda na festa do santo

 

         A roda e o giro

 

Flor no cabelo e no rosto a risada

 

 

 

Ramo de goiabeira na água do rio

 

Sarã que recolhe a ramagem vadia

 

O grito do sol na risada do rio

 

A dança das folhas e as comadres de rio

 

A roupa lavada no colo do rio

 

O peixe apanhado pelo homem-menino

 

Canoeiro que traça o caminho do rio

 

Pescador que apanha o segredo do estio

 

O menino que sonha com jurema do rio

 

A mão do pescador que toca a viola

 

A dança dos homens e mulheres do rio

 

A lua que enlaça o silêncio do rio...

 

O rio é o rio...

 

 

Autor: PAULO FERRAZ

 

 

Biografia

Paulo Ferraz (Rondonópolis, 1974) é um poeta brasileiro. Viveu em Cuiabá até 1995, quando se transferiu para São Paulo, onde se graduou na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, sendo um dos editores das revistas O Onze de Agosto e FNX. Concluiu mestrado em Teoria Literária na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.

Em 1999 publicou seu primeiro livro de poemas, 'Constatação do óbvio, pelo Selo Sebastião Grifo, fundado por ele, Matias Mariani e Pedro Abramovay. Com ambos editou ainda a revista Sebastião (o primeiro número em 2001 e o segundo em 2002), com a qual colaboraram Armando Freitas Filho, Paulo Henriques Britto, Nelson Ascher, Régis Bonvicino, Frederico Barbosa, Donizete Galvão, Fabio Weintraub, entre outros. Em 2007, lançou dois novos livros De novo nada (poema de quase 600 versos) e Evidências pedestres, também pelo Selo Sebastião Grifo.

 

 Obras:

FÁBULA

 

Farinha e água condicionam

a insignificância sobre a

língua, porque é o corpo que no

corpo reafirma o desejo

de sobreviver à morte

da matéria. Na hóstia habita o

cristo por alguns minutos,

da boca úmida não desce

para o estômago, caminho

natural do que nos entra,

não se sabe como, sobe

para um canto da cabeça.

 

Fora do adro o mundo cresce

nos olhos e não demora

começa a ocupar o espaço

da idéia de redenção. Cristo

tenta continuar presente,

mas é um tanto tarde, o corpo

não é só cabeça, restando ao

cordeiro, por estratégia,

se pregar na cruz mais próxima.

 

 

 

A PARTIR DA TOPOGRAFIA

 

Aprende-se muito

com a ausência. Cito a arte

da cartografia, do

paciente desenho

feito olhos a dentro

sem régua ou compasso,

com o qual catalogo, a

posteriori, pintas,

sinais de nascença, e as

(não sem ser expert no

teodolito) marcas

de uma catapora.

 

 

A POÉTICA VISTA NUM ARMÁRIO

 

Suspenso por esses

ombros finos – qual fumaça

condensada em pano

não pela ação de intempéries,

mas pelo domínio

das mãos sobre o bruto – quanto

guarda de um conteúdo

já tido? Seu corte fôrma

não é para o aparente ]

vazio. Se me entrego às curvas

e drapeados, deixo

me envolver na trama e ali me

posto. Logo noto o

dom que o fez, paciente e certo,

por metros em que eu, que

nada sei de seus motivos,

constato em qual corpo

cairia – de pronto me espanto,

pois se forma dentro

de mim – mesmo sendo roupa – a

sensação do toque.

 

 

DE UMA CRÍTICA PUBLICADA NUM SUPLEMENTO CULTURAL DE DOMINGO

(fragmento)

 

II (o artista: depoimento)

 

Estudei dos 20 aos 30

na Europa, tempo de intenso a­

prendizado, mas só conto os

dois anos depois da volta, es-

senciais para a concreção do

meu estilo, pois passei longos

meses nas ruas favelas,

freqüentei cortiço, abrigo e

bueiro, conheço essa gente

pelos nomes, inclusive

seus cachorros, cheguei mesmo a

me sentir igual eles.

 

 

 

 

Autor: RONALDO DE CASTRO

 

De

 

CUIANANÁLIA

 

Cuiabá: Fundação Cultural, 1989

 

 

Biografia

 

Nasceu em Cuiabá, Mato Grosso, em 1941, mês de março, 17. Filho do consagrado poeta Rubens Mendes de Castro e da abnegada professora Antonia de Arruda Castro ( professora Teté). Autor de várias obras inéditas. 

 

 

Obras:

 

A ÁGUA

 

A água corre

 

a distância cilíndrica

 

e num jato frio morre

 

na boca nívea da pia

 

 

 

A esponja mineral

 

do canteiro chupa a água

 

O esgoto é sepultura

 

das águas desta cidade

 

que lavam ruas e sexos

 

e a sede matam também

 

 

 

Pluvial ou água clorada

 

a água líquida informe

 

são as formas diluídas

 

de sorrisos naufragados

 

 

 

Quando o gelo é água dura

 

engarrafada é pileque

 

no rio é casa de peixe

 

no céu é nuvem eqüestre

 

no mar pode ser salitre

 

 

 

Água água sempre água

 

deslizante fugidia

 

água benta batizando

 

água suja intoxicando

 

água quente e água fria

 

 

 

Já que a seca é falta d´água

 

matando plantas e bichos

 

a humanidade é pau-d´água

 

 

 

Água água sempre água

 

 

 

A ÉGUA

 

 

 

A égua corre

 

come a pista

 

engole o pasto

 

bebe a água

 

 

 

Quando ela come

 

o espaço vasto

 

os seus humores

 

molham o pasto

 

 

 

A água forte

 

patas aéreas

 

carreiras corre

 

correndo ganha

 

 

 

Porém se topa

 

no prado o macho

 

relincha fêmea

 

só vê o sexo

 

 

 

Seu vôo pára

 

a fúria abranda

 

correr não corre

 

não come a pista

 

 

 

(Domesticou-se

 

no prado a água:

 

só bebe água

 

e engole pasto)

 

 

 

SINTAXE

 

 

 

Palavras militarizadas

 

vigiadas pelo batalhão de guardas diacríticos

 

?   ,   ´   —   ^  :   .   —   ;   !

 

Palavras      palavras    palavras     palavras

 

Militar—izadas   

 

 

 

Palavras     algemadas    virguladas

 

Proibidas  de viver por  si  mesmas

 

Perfiladas  em  posição  de  sentido

 

Esquerda  volver       direita  volver

 

 

 

Palavras mar-chadeiras   marcha-deiras

 

palavras de co-turno

 

letras feitas de –––––––––––––– silêncio

 

palavras insonoras

 

m i l i t a r i z a d a s

 

 

 

Palavras sem vôo próprio

 

amarradas ao chão de outras palavras

 

grávidas de ––––––––––––––––  silêncio

 

sôfregas de liberdade

 

filhas da ordem-do-dia

 

palavras     palavras     palavras

 

um — dois   um — dois   um — dois

 

 

 

Palavras em—fileira—das

 

bem alinhadas e tristes

 

a que faltam alvoradas

 

 

 

palavras encabrestadas

 

algemadas   virguladas

 

m i l i t a r i z a d a s

 

         p a l a v r a s

 

 

 

Os homens são palavras marcha-deiras

 

m i l i t a r i z a d a s

 

na sintaxe social

 

 Autor: SILVA FREIRE

 

 

(1928-1991) 

 

Biografia

Benedito Sant'Ana da Silva Freire nasceu em Mimoso, Distrito localizado no Município de Santo Antônio do Leverger - MT, em 20 de setembro de 1928, e faleceu em Cuiabá MT, em 11 de agosto de 1991.

Conterrâneo do Marechal Cândido Rondon, Silva Freire, foi poeta, advogado, professor na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT, e ocupou a cadeira nº 38 da Academia Mato-grossense de Letras - AML. 

Recebeu diversas homenagens, entre elas, a homenagem do Univag Centro Universitário de Várzea Grande MT, que deu o nome deste intelectual à sua biblioteca. 

Obras principais: Meu Chão; Pássaro Implume; As Redes; Os Meninos de São Benedito; Águas de Visitação; Trilogia Cuiabana, publicada em 1991.

CERRADO / RAÍZES

 

 (Fragmento)*

 

—cerrado

arbusto miúdo

o ar no alto do

busto recurvo um grito no

susto da planta dos pés     

o ritmo da floração

no coração ancestral

 

— cerrado

experiência de estar no perto

/ na caixa do peito

na folha do livro

 

— cerrado

tecido telúrico/       

processo/     

ngresso na história  

e/ou

regresso atávico

no trançado que amassa

a raça         

que adelgaça

 

— nos calombos do cerrado

tempo-tropelro ...

curva-cuia (bania)

b-oiando

no liso-a-liso

do

berro

que

afoga

na linha reta do pantanal.. .

 

• FRElRE, Silva, Aguas de Visitação, Cuiabá / MT - Adu/mat, 1999  

 

===============================================================

 

Extraído de
ALVES, Henrique  L., org.  Poetas contemporâneos.  Capa de Alfredo Volpi. São Paulo: Roswitha Kempf Editores, 1985. 

 

 

- a canoa coisifica a respiração da madeira        

         (alimento do aviso)

 

- o canto

           (beira-chão-barranco)

           responde no toque-atabaque

                    traço-truque-do  leque

                                                   membrana d’água

- a canoa circunscreve a escrita

                                  que irrita

                                   tato-peixe

- da colher do remo

                            pinga o desenvolvimento

                            do curso inventado

- a canoa trabalha a função do reflexo

               canoa                 remo

                    remoer do homem

                             canoeiro

               canoeirar o rio-equilíbrio

- o sulco ferido

                      (feriado)

                          gruda

        a negritude do aquaremo

- balanço que bate embalo

                                      pla

                                      plaque

                                      pla

                                               sono-módulo prisão-no-porto

                                                                            ou morto

- a canoa concebe

                            boca que inventa o vento

                            tempo que a fome urra

                            riso que o peixe isca

                            abrangência de mormaço

- a canoa incorpora

                            intuir a chuva

                            carne-viva vida-nova

                                       viva-vida

 

                            pose do embarque

                            tensão do emborcado

                                  iodo do Iodo

                                         Iobo

 

 

 

- o remeiro imanta o pranto

                            no canto

                            que canta

                                           a queda do peixe

                                 limpo     limbo

                                 lama       limo

                                 lima-que-lima

                            a invenção da canoa

- a canoa insere no assento

                     o nojo do rio

- a canoa investe o lucro

                                      na transparência da sombra

                                      interior do sem-medo

                                      eventual da paisagem

                                      no corte que a linha quebra

- a canoa enfeita

                            hirto olho vela velório

                                      boi-afôgo

                            boiaafogando barriga d’água

- a canoa escritura

                            a faca da curva

                              leva-e-lufada

                            remoinho que o rio incesta

- a canoa desperta

                            esmalte da escama

                            fundição da faca

                            dependência do anzol

                            o peso que a poita aponta

- noturno

              a canoa soletra

              o enredo da pesca

 

 

De
Silva Freire
Águas de Visitação
Cuiabá:  Edições do Meio, 1979.  s. p. 

Col. Poetas de Mato Grosso, série      Vanguarda, I)   
[Diagramação: Wlademir Dias-Pino]

 

 

 

garimpo da infinitude
(fragmento)

 

— o garimpo
               vaza
   eco da sorte
no pilão da bateia


                            — o garimpo é hermético
                                estranhamente aberto
                                         ao receber o rito
                                                           hirto
                                                           mito
                                                  e o místico

 

 

 

— o garipmeiro
crava
na lavra
pálpebra / forma
que arredonda o chibiu

 

 

 

— o garimpo codifica o sonho
                             minerador
—   o garimpo decodifica  a
        leitura da mancha

 

 

 

                            — outros amigos:
                                o pai
                                              irmão
                            o                esmo
                            o                 meio
                            o    meia  -  praça

 

 

 

o garimpo talha
moe
romoe
moenda
remorrendo
na brita do sol
no brilho da vida
no budum do lençol